EFEITO DA POLARIDADE DO SOLVENTE NA BARREIRA ROTACIONAL DE ENECARBAMATOS E ENAMIDAS ENDOCÍCLICAS
Carlos Roque Duarte Correia (PQ)a, Luiz Antonio Mazzini Fontoura (PG)a,b
e Italo José da Cruz Rigotti(PG)a
(a) Departamento de Química Orgânica, Instituto de Química, Universidade Estadual de Campinas, C.P. 6154, 13083-970, Campinas, SP.
(b) Departamento de Química, Fundação de Ciência e Tecnologia,
Rua Washington Luiz, 675, 90010-460, Porto Alegre, RS.
palavras-chave: barreira rotacional, enecarbamatos, enamidas.
1.
Introdução: O caráter parcial de dupla da
ligação nitrogênio-carbonila em amidas e
carbamatos provoca o surgimento de rotâmeros. A figura 1, a
seguir, apresenta o equilíbrio conformacional de enecarbamatos
e enamidas endocíclicas.
figura 1 - interconversão entre as conformações ap e sp.
Enecarbamatos e enamidas são importantes intermediários em síntese orgânica. A reatividade desses compostos depende da maior ou menor ativação da dupla endocíclica pelo nitrogênio, o que é determinado pelo seu grupo protetor. Um maior comprometimento do par eletrônico do nitrogênio com a carbonila, isto é, um maior caráter de dupla da ligação amídica, resulta em uma menor reatividade da ligação insaturada do anel frente a eletrófilos. Com o objetivo de melhor prever a reatividade de enecarbamatos e enamidas temos realizado estudos teóricos e experimentais sobre os fatores que influenciam o valor da barreira rotacional. Neste trabalho, apresentamos um estudo do efeito da polaridade do solvente.
2. Metodologia: Os compostos 1 a 4 tiveram as suas barreiras rotacionais determinadas experimentalmente pelo método de Shanan-Atidi e Bar-Eli1 por 1H-RMN em C6D6 e C6D5NO2. Os espectros de 1H-RMN desses compostos apresentam sinais duplicados à temperatura ambiente devido a presença dos rotâmeros. O método consiste na determinação da temperatura de coalescência desses sinais.
Ao mesmo tempo, os compostos 1 e 3 foram alvo de estudos computacionais2. A geometria dos compostos foi otimizada via método semi-empírico (AM1) restringindo-se o ângulo de diedro q (C2-N1-C6-O7) de 0º a 360º em incrementos de 10º. As conformações de mínima (rotâmeros sp e ap) e máxima energia (ET1 syn e ET2 anti) foram novamente otimizadas, porém por método ab initio (HF/6-31G*).
3. Resultados e Discussão: Os valores das barreiras rotacionais determinados experimentalmente são mostrados na tabela 1 enquanto os resultados teóricos (HF/6-31G*), na tabela 2.
tabela 1 - resultados experimentais |
|
tabela 2 - resultados computacionais |
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|
DG¹ap-sp (kcal mol-1) |
|
|
1 |
3 |
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E (Hartree) |
m (Debye) |
E (Hartree) |
m (Debye) |
|||||
comp. |
C6D6 |
C6D5NO2 |
|
|||||
1 |
15,94 |
16,05 |
|
sp |
-475,66574 |
2,74 |
-361,755012 |
4,02 |
2 |
16,07 |
16,06 |
|
TS1 |
-475,63616 |
2,85 |
-361,723934 |
3,59 |
3 |
- |
19,00 |
|
ap |
-475,66564 |
2,22 |
-361,755353 |
3,59 |
4 |
16,62 |
17,62 |
|
TS2 |
-475,63794 |
1,18 |
-361,729068 |
2,10 |
|
|
DG¹ap-sp |
17,4 kcal mol-1 |
16,3 kcal mol-1 |
Os confôrmeros mais estáveis são aqueles em que o diedro q (C2-N1-C6-O7) vale 0 (sp) e 180º (ap), enquanto os de máxima energia, 110 (ET1) e 300º (ET2). Os confôrmeros de máxima energia são considerados os estados de transição no processo de conversão de uma conformação de mínima energia na outra (figura 1). O estudo computacional mostra que para 1, usado como modelo para enecarbamatos, ET1 e ET2 apresentam energias semelhantes. Neste caso, os dois estados de transição são igualmente prováveis e a interconversão de sp em ap não deve passar por um caminho preferencial. ET1, entretanto, possui maior momento de dipolo (m) que ET2. Em solventes polares, ET1 deve sofrer alguma estabilização e passa a ser o caminho preferencial. Como m dos confôrmeros ET1, ap e sp são semelhantes, o efeito do solvente deve ser percebido por todos e a barreira rotacional, isto é, a energia de ativação na interconversão de um rotâmero no outro, não se altera. De fato, os resultados experimentais mostram que a troca do solvente de C6D6 para o mais polar C6D5NO2, não alterou o valor da barreira rotacional. No caso de 3, usado como modelo de enamida, ET2 é 3,22 kcal mol-1 mais estável do que ET1sendo, portanto, o estado de transição preferencial. Como ET2 apresenta m significativamente menor do que os rotâmeros sp e ap, um solvente polar estabilizaria os dois últimos, mas não o primeiro, aumentando a diferença de energia entre eles. O resultado esperado, neste caso, é um aumento na barreira rotacional, o que foi confirmado experimentalmente para 4. Estes resultados estão de acordo com estudos anteriores desenvolvidos por Lectka e Cox3.
4. Conclusão: Experimentalmente foi observado que um solvente mais polar aumenta a barreira rotacional de enamidas, mas o mesmo não se observa em enecarbamatos. Estudos teóricos tomando como modelo os compostos 1 e 3 mostram que o fenômeno pode ser explicado por meio do momento de dipolo dos estados de transição.
Referências:
(1) Shanan-Atidi,H. & Bar-Eli,H. J.Phys.Chem.1970, 74, 961.
(2) PcSpartan Plus, versão 1.5, Wavefunction, 1997.
(2) Cox,C. & Lectka,T. J.Org.Chem. 1998, 63, 2426.
CNPq, FAPESP