SUBSTÂNCIAS E MISTURAS: ASSIM ESTAVA ESCRITO
NO LIVRO DIDÁTICO
Marta Francileide Gonzaga da Silva (FM)1, Edenia Maria Ribeiro do Amaral (PQ)1 e Rejane Martins Novais Barbosa (PQ)1
1 Centro Escolar São José
2 Universidade Federal Rural de Pernambuco
palavras-chave: substâncias e misturas, ensino fundamental, livro didático
Em geral, os professores de ciências de quinta a oitava série consideram o livro didático uma importante fonte no aprimoramento de seus conhecimentos e suporte quase que exclusivo para as suas aulas. Também os alunos, na sua grande maioria, apresentam esta visão com relação aos livros didáticos. Contudo, segundo Bittencourt (1997), o livro didático é uma mercadoria, fabricada por uma produção industrial, com fins lucrativos, de acordo com a lógica da economia capitalista. Não apresenta apenas um único autor, sofre alterações por outros sujeitos, devido à necessidade de reformulação: tornar a linguagem simples, adequada ao público jovem, à crianças e adolescentes, quando apresenta conceitos complexos do ponto de vista científico. Isto pode, muitas vezes, comprometer o texto didático. Bizzo (1996) em uma pesquisa relacionada com a análise dos livros didáticos, feita pelo MEC, afirmou que certos erros não só mostram a ignorância dos autores, como também a sua comodidade e displicência em não pesquisar para a veiculação do que é correto.
A partir de outros parâmetros de análise, Amaral et al. (1999) pesquisou amplamente 22 coleções didáticas de ciências, de 5a a 8a séries, destacando quatro categorias de análise, tomadas como concepções fundamentais no ensino de ciências: Cotidiano, Ambiente, Ciências-Tecnologia-Sociedade e Saúde. Os resultados revelaram dezenove coleções inadequada, três pouco adequada e nenhuma enquadrada como adequada. Maldaner e Piedade (1995) relataram que quando se escreve ou se discute sobre ensino/aprendizagem em química, há uma ênfase na baixa qualidade tanto das propostas de ensino (livros didáticos mais usados) como da compreensão da ciência química, em particular, por alunos do ensino médio.
A preocupação torna-se maior em decorrência da ineficiência da formação em química ao longo do ensino fundamental. Normalmente, nesse período, os professores possuem um defasado conhecimento químico e se agarram aos livros didáticos. Como foi dito, estes, muitas vezes não apresentam o cuidado com a linguagem utilizada, podendo originar concepções alternativas, que surgirão nas séries futuras como obstáculos na compreensão científica dos conceitos.
Com o objetivo de buscar algumas das origens das concepções prévias dos alunos, este trabalho se propôs a analisar a forma como os livros didáticos do ensino fundamental abordam conceitos químicos como: substância, mistura, elemento químico e reação química.
Foram analisados um total de oito livros (quatro da quinta série e quatro da oitava série), dos mais utilizados pelos professores de ciências. Os livros da sexta e sétima séries não foram analisados, por tratarem especificamente de Biologia.
Os resultados mostraram que, na maioria dos livros, existem muitas distorções no uso dos termos substância, elemento, mistura, que muitas vezes são utilizados sem nenhuma preocupação com o seu nível conceitual. Os autores tratam substância como elemento e vice-versa: ...A lista é interminável assim como os elementos químicos que compõem as águas: sulfatos, brometos, bicarbonatos e sulfatos". Também ficou claro que mistura e substância são tratados sem uma diferenciação nítida: assim como o açúcar, muitas outras substâncias sólidas, líquidas e gasosas se dissolvem na água. É o caso, por exemplo, do sal, do leite em pó, do álcool, do vinagre, do vinho, do ar, do gás carbônico, etc. e ainda: Podem ser testadas muitas outras substâncias, como: suco de tomate, solução de soda cáustica, vinagre, cal. Estes e muitos outros exemplos podem levar os alunos a terem dificuldades de diferenciar substância de elemento químico e de mistura. Como conseqüência não se faz uma boa construção de outros conceitos, como reação química, quando os alunos não conseguem visualizar a transformação das substâncias ou o rearranjo dos elementos químicos, não diferenciando quando uma mistura resulta ou não em um novo produto.
Um fato agravante é a utilização destes termos dentro de contextos diferentes, com significados diferentes, sem uma preocupação com as possíveis confusões geradas a nível conceitual: "...Além do solo, que já estudamos, a água é outro elemento que constitui o ambiente em que vivemos. É um elemento importantíssimo.... Em alguns lugares sobra, em outros falta. Nesta unidade vamos ver em que consiste este elemento chamado água. Muitas vezes, as distorções aparecem nos livros didáticos, quando se tenta contextualizar alguns temas utilizando uma linguagem facilitada: ...A água passa pelos poros, mas o pó, não; a água conserva os elementos que dão o sabor e a cor do café. Faz-se necessário que os professores tomem consciência destas fragilidades e trabalhem os textos advindos dos livros didáticos com o espírito crítico, dentro de uma prática dialógica com o aluno para que significados e conceitos possam ser construídos. Um posicionamento crítico e mais exigente diante deste e de qualquer outro material didático utilizado em sala de aula é o que os farão cada vez melhores.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AMARAL, I.A.; AMORIM,A.C.R.; NETO,J.M. E SERRÃO,S.M. Algumas tendências de concepções fundamentais presentes em coleções didáticas de ciências de 5ª a 8a séries. II Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPEC). Valinhos;SP. Setembro, 1999.
BITTENCOURT, C. M. F. Livros didáticos: concepções e usos. Coleção Qualidade do Ensino, Série Formação do Professor. SEE, Recife. p. 2 10, 1997.
BIZZO,N. Graves erros de conceito em livros didáticos de ciências. Ciências Hoje. vol. 21, n. 121, p. 26 35, 1996.
MALDANER, O. .A. e PIEDADE, M. do C. T. Repensando a química. Química Nova na Escola. n. 1, p. 15 19, 1995.