OBTENÇÃO DO NANOCOMPÓSITO ÓXIDO DE CÉRIO/VIDRO POROSO VYCOR VIA DECOMPOSIÇÃO DE PRECURSOR METALORGÂNICO (MOD)


Marcela Mohallem Oliveira (PG), Oswaldo Luiz Alves (PQ)

Laboratório de Química do Estado Sólido - Instituto de Química, Unicamp, CP 6154, CEP 13081-970, Campinas, S.P., Brasil

mohallem@iqm.unicamp.br


Palavras-chave: vycor, MOD, óxido de cério.


Nos últimos anos, a pesquisa e a literatura relacionadas com a obtenção de nanocompósitos e nanopartículas vem sendo fortemente exploradas. Um dos vários métodos de obtenção de tais sistemas é a utilização de poros, canais ou cavidades de estruturas denominadas “hospedeiras”.[1] No trabalho aqui relatado, a matriz hospedeira utilizada é o Vidro Poroso Vycor (PVG), produzido pela Corning (cod. 7930). Tal vidro possui uma rede tridimensional aleatória de poros, com tamanho variando entre 10 a 200 Å. Estes apresentam, ainda, quantidades substanciais de grupamentos silanóis (Si-OH) na sua superfície. O PVG apresenta alta estabilidade térmica, chegando à consolidação entre 900 e 1200oC, e fundindo a 1500oC.[2] As propriedades descritas deixam claro que o PVG mostra-se uma matriz adequada para a obtenção de nanocompósitos, uma vez que o tamanho de seus poros está de acordo com a escala de tamanho desejada.

A técnica denominada Decomposição de Precursores Metalorgânicos (MOD) vem sendo ultimamente muito utilizada na obtenção de óxidos na forma de filmes. Sua premissa básica consiste na obtenção de óxidos via pirólise de um precursor metalorgânico, sendo que uma de suas principais vantagens é a obtenção dos produtos finais em temperaturas mais baixas que em obtenções convencionais, como por exemplo, a calcinação.[3] O presente trabalho baseou-se no aproveitamento das vantagens dessa técnica na preparação do nanocompósito no interior dos poros do Vycor, objetivando a preparação do nanocompósito óxido de Cério (CeO2)/PVG, através da decomposição térmica do precursor metalorgânico 2-etil hexanoato de Cério, no PVG.

O PVG, em placas de tamanho 1,0 X 1,0 X 0,2 cm, foi previamente tratado, para eliminação de qualquer composto indesejável em seu interior.[2] A impregnação do precursor no PVG foi feita via imersão das placas nas soluções de 2-etil hexanoato de cério(III) em hexano, com concentrações variando entre 1,0 e 1,0.10-4 mol.L-1, por 30 minutos em atmosfera ambiente. Após secagem à baixa pressão (~10-4 mm de Hg), as amostras foram pirolisadas a 600o C, durante 2 horas. A evolução e caracterização da decomposição das amostras foi feita por espectroscopia infravermelho com transformada de Fourier (DRIFT), absorção ótica na região do UV-Vis, espectroscopia Raman e Análise termogravimétrica.

O precursor de cério livre apresenta bandas de IV muito intensas na região entre 3100 e 2800cm-1, atribuídas aos estiramentos C–H dos grupos –CH3 e –CH2–. Tais bandas podem ser observadas (fraca intensidade) juntamente com as bandas do PVG no espectro das amostras impregnadas. O PVG livre apresenta bandas relativas ao estiramento O-H em 3745 e 3650 cm-1, associadas aos grupos silanóis existentes na superfície dos poros.[4] A banda em 3745 cm-1 sofre uma diminuição de intensidade à medida em que a concentração da solução do precursor aumenta, sugerindo a ocorrência de interação dos grupos silanóis com o precursor. Após a decomposição térmica a banda descrita volta a ser muito similar ao PVG livre, sendo uma indicação que: i) os grupos silanóis mantém-se íntegros após o tratamento térmico da amostra impregnada e ii) o produto formado não interage significativamente, pelo menos com os grupos silanóis presentes nos poros.

Os resultados da evolução da decomposição no UV-Vis mostram que, nas temperaturas de 300 e 400oC observa-se uma banda larga e mal resolvida, cuja intensidade somente atinge o valor de zero (linha de base) para comprimentos de onda da ordem de 700 nm. Este alargamento de banda está diretamente relacionado com os produtos da pirólise do precursor, uma vez que é observado na faixa de temperatura onde o mesmo se decompõe. Os espectros da amostra nas temperaturas de 500 e 600oC, onde o material está totalmente decomposto, são muito semelhantes, apresentando duas bandas situadas ao redor de 266 e 300 nm. Tais resultados deixam claro que o produto de decomposição não-volátil permanece no interior dos poros, quando comparados com resultados para o PVG puro submetido ao mesmo tratamento.

Nos espectros Raman para o sistema PVG+precursor observam-se fortes sinais atribuídos à fluorescência, além de bandas com alguma definição em 189 cm-1, 440 cm-1, 832 cm-1 e na região de 1580-1660 cm-1, que podem ser atribuídas ao PVG. A ausência de bandas relativas ao precursor de cério poderia ser explicada pelo fato do espalhamento do vidro poroso ser muito intenso nessa região. Uma análise cuidadosa do espectro para a amostra pirolisada demonstra que não há a observação de novas bandas que possam ser atribuídas ao produto final de decomposição do precursor, apesar de poderem ser notadas algumas variações de intensidade, sobretudo na região onde são esperados os modos de vibração metal-oxigênio.

As medidas de análise termogravimétrica revelaram que a perda de massa para o PVG puro até 150oC é da ordem de 2,3%, podendo ser relacionada com a eliminação de vapores e compostos voláteis. Para os termogramas das amostras com diferentes concentrações fica claramente evidenciado o efeito da presença e concentração do precursor. Os termogramas não apresentaram definição tal que permitisse discriminar os diferentes eventos térmicos. A maior perda de massa é observada para a amostra impregnada com solução 1,0 mol/L, onde temos uma estimativa de formação de 9,34 mg de óxido/g de PVG.


[1] A.J.G. Zarbin, M.D. Vargas, O.L. Alves, J. Mater. Chem., 1999, 9, 519.

[2] Corning Glass Work, Mater. Eng., 1979, 90, 92.

[3] R. W. Vest, Ferroeletrics, 1990, 102, 53-68.

[4] M. J. D. Law, N. Ramasubramanian, J. Phys. Chem., 1966, 70, 2740.

FAPESP [98/05048-0], PRONEX