POLIFOSFATOS EM DETERGENTES EM PÓ COMERCIAIS


Ana Cristina Aparecida Naves Manzela dos Santos (PQ), Wanda de Oliveira (PQ)

e Viktoria Klara Lakatos Osorio (PQ)

Departamento de Química Fundamental, Instituto de Química, USP


palavras-chave: fosfatos inorgânicos, cromatografia em papel, detergentes em pó


Fosfatos condensados vem sendo adicionados a detergentes em pó há décadas, com o objetivo de complexar os íons metálicos responsáveis pela dureza das águas. Detergentes comerciais típicos da década de 50, por exemplo, continham ca. 40% de tripolifosfato de sódio ou uma mistura deste com pirofosfato de sódio.1

Com o passar do tempo, a utilização crescente desses produtos de limpeza aliada à aplicação não criteriosa de fertilizantes fosfatados nas lavouras acabaram originando problemas ambientais, por servirem como nutrientes de algas, cuja superpopulação provoca a eutrofização das águas naturais estagnadas.2

Para contornar este problema, surgiram legislações restringindo a adição de fosfatos em detergentes.2 Um substituto conveniente e bastante recomendado são as zeólitas, aluminossilicatos trocadores iônicos que abrandam águas duras.3

Uma consulta às embalagens de detergentes em pó, nos supermercados, esclarece que poucas marcas contem zeólitas, mas todas utilizam fosfato.

Ortofosfato e fosfatos condensados podem ser separados e identificados por cromatografia em papel. Um experimento didático sobre este assunto, já tradicional nos cursos de Química Inorgânica do Instituto de Química da USP, foi proposto para caracterizar o produto de uma preparação de tripolifosfafo ou para identificar amostras artificiais constituídas de mistura de fosfatos.4

Desde 1995, este experimento foi adaptado com os objetivos de identificar fosfatos inorgânicos presentes em detergentes em pó comerciais e ilustrar alguns princípios relacionados com dureza de águas.

Nessa aula prática, cada equipe de alunos recebe um pedaço de papel para cromatografia Whatman no 1 (dimensões 6,5 x 20,0 cm), onde são aplicadas, com o auxílio de capilares, soluções de 4 amostras. São três padrões (ortofosfato, pirofosfato e tripolifosfato de sódio) e um detergente em pó comercial. Os alunos são incentivados a trazer de casa a amostra de detergente. A utilização de diferentes marcas aumenta a motivação e o interesse ao final do experimento, quando são coletados os resultados.

As soluções dos padrões contém 0,1 g do sal em 5 mL de água destilada, enquanto a do detergente em pó é obtida dispersando 0,3 g em 5 mL de água destilada. A suspensão pode ou não ser filtrada, não interferindo no resultado.

Como o experimento é demorado, o eluente deve ser preparado previamente e colocado (50 mL) em cubas cilíndricas (de 20 cm de altura e 10 cm de diâmetro) com uma hora de antecedência. O eluente utilizado (acetona, ácido tricloroacético, água e uma pequena quantidade de hidróxido de amônio)4, 5 é uma modificação do eluente ácido de Ebel.6 Substituindo o álcool iso-propílico por acetona, reduz-se a cerca de 1/3 o tempo de eluição necessário e aumentam os valores de Rf, aproveitando melhor o espaço disponível no papel cromatográfico. O eluente leva 60 a 70 min para migrar ca. 10 cm, à temperatura ambiente.

Enquanto o cromatograma se desenvolve, os alunos executam os ensaios referentes ao estudo de águas duras, identificando os íons presentes através de testes qualitativos, diferenciando águas duras temporária e permanente pelo efeito do aquecimento e comparando a formação de espuma por sabões em pedra e detergentes líquidos, em água destilada e em água dura.

Para a revelação, os cromatogramas são borrifados com solução ácida de molibdato de amônio4. O ortofosfato produz mancha amarela (fosfomolibdato de amônio) e os demais manchas azuis (azul de molibdênio), que aparecem após exposição do papel à luz ultravioleta de ondas longas.

Nos detergentes comerciais identifica-se o tripolifosfato. Sob a luz UV, é possível constatar também pigmentos fluorescentes, os branqueadores ópticos, cuja presença e função surpreendem muitos alunos.

A correlação entre os dois conteúdos explorados neste experimento é feita adicionando tripolifosfato de sódio à água dura e verificando a formação de espuma com sabão.

Resultados típicos de Rf são fornecidos a seguir:



Orto-fosfato

Piro-

fosfato

Tripoli-fosfato

OMO

multi-ação

OMO

cores

OMO

máquina

ARIEL

Rf

0,85

0,63

0,48

0,44

0,65; 0,43

0,44

0,41


Os valores um pouco mais baixos de Rf encontrados para detergentes especiais para máquinas de lavar dão oportunidade para a busca de explicações, tais como a interferência de outros aditivos.

Este experimento permite discussões pós-laboratório muito abrangentes, englobando desde técnicas cromatográficas até dureza de águas, passando por ação complexante de polifosfatos, processos de abrandamento, diferenças entre sabões e detergentes, função dos aditivos nos detergentes, problemas ambientais em cursos de água, detergentes biodegradáveis ou não, BOD, eutrofização.7, 8


1 E. Karl-Kroupa, Anal. Chem., 1956, 28, 1091.

2 P. L. Layman, Chem. & Eng. News, 1984, 62 (4), 17.

3 P. L. Layman, Chem. & Eng. News, 1982, 60 (39), 10.

4 E. Giesbrecht et alli, Experiências de Química, Ed. Moderna, 1979, exp. 25.1.

5 D. N. Bernhart e W. B. Chess, Anal. Chem., 1959, 31, 1026.

6 J. P. Ebel, Bull. Soc. Chim. France, 1953, 20, 998.

7 H. S. Stoker, Chemistry, a Science for Today, MacMillan, 1989.

8 J. W. Hill e D. K. Kolb, Chemistry for Changing Times, 7a ed., Prentice Hall, 1995.

(CNPq)