Propriedades Pró-oxidantes e Comportamento Redox de Alguns Compostos de Cobre com Ligantes Diimínicos
Maria Lúcia P. dos Santos (PG), Izilda A. Bagatin (PQ) e Ana M. Da Costa Ferreira (PQ)
Departamento de Química Fundamental, Instituto de Química, Universidade de São Paulo, Av. Prof. Lineu Prestes, 748, CEP 05508-900, São Paulo, SP, Brasil.
Palavras-chaves: compostos diimínicos de cobre; radicais livres; propriedades redox.
Compostos de cobre vêm despertando grande interesse nas últimas décadas em decorrência da presença deste metal no sítio ativo de inúmeras enzimas e proteínas, onde apresentam diferentes características estruturais, exercendo as mais diversas funções. Proteínas de cobre estão envolvidas em vários processos essenciais à vida, incluindo a respiração e o controle de espécies radicalares decorrentes da reatividade do oxigênio. A grande diversidade de estruturas e reatividades apresentadas por estas proteínas motivou inúmeros estudos bioinorgânicos, visando mimetizar aspectos espectroscópicos e magnéticos, além de suas características funcionais. Dentre estes estudos destacam-se aqueles envolvendo ligantes do tipo imínico, conhecidos tanto por serem eficientes catalisadores da dismutação de radicais superóxido (atividade SOD), como por promoverem a oxidação de diferentes substratos (atividade oxigenase ou oxidase).
Vimos estudando já há algum tempo compostos diimínicos de cobre, com ligantes tri- e tetradentados, que se mostraram bons miméticos da atividade SOD [1,2], além de apresentarem configurações eletrônica e geométrica bastante similares ao centro ativo da enzima nativa, Cu2,Zn2 SOD. Novos compostos foram preparados, a partir da condensação de compostos carbonílicos e diferentes aminas, na presença de perclorato de cobre(II), sendo caracterizados através de estudos espectroscópicos (UV/Vis, infravermelho e EPR) [3].
Apesar de suas propriedades antioxidantes acentuadas, foi observado que estes compostos podem também causar peroxidação lipídica de membranas, em presença do reagente peroxinitrito. Constatou-se agora que em presença de peróxido de hidrogênio (3,00 mM) estes compostos também promovem a peroxidação de lipossomas, preparadas a partir de L-a-fosfatidilcolina. Nestes experimentos utilizaram-se concentrações dos compostos na faixa de 50-150 mM, com incubação por 40 minutos, a 37°C, em tampão fosfato 50 mM (pH = 7,4), analisando-se os produtos formados pelo método TBARS (produtos reativos ao ácido tiobarbitúrico), com medidas da absorbância a 532 nm (e = 156.000 M-1 cm1) [4].
A modulação da atividade catalítica pelo ligante utilizado também foi observada neste caso, embora a ordem de reatividade observada na peroxidação lipídica iniciada pelo peróxido de hidrogênio não tenha sido a mesma que havia sido constatada com peroxinitrito. Observaram-se diferenças entre todos os compostos estudados, sendo o mais ativo o composto [Cu(apz-pn)]2+, que também mostrou ser o melhor mimético funcional da SOD. Com peroxinitrito, ao contrário, todos os compostos apresentaram capacidade de causar danos oxidativos equivalente à do íon [Cu(H2O)4]2+, à exceção do [Cu(pyal-en)]2+, com atividade cerca de duas vezes maior que os demais. Em ambos os casos, a lipofilicidade dos compostos, determinada em misturas n-butanol/água, com coeficientes de partição entre 0,22 e 3,47, não parece ser um fator determinante deste tipo de reatividade.
Além disso, neste processo de estresse oxidativo em presença de peróxido de hidrogênio, foi detectada a geração de espécies reativas de oxigênio, especialmente radicais hidroxil, através de espectroscopia EPR (espectrômetro Bruker, modelo EMX), usando celas achatadas usuais de quartzo e DMPO (0,100 M) como captador de spin. Estes experimentos, realizados à temperatura de 25°C, em tampão fosfato 50 mM (pH = 8,0), usando [H2O2] = 1,52 mM e concentrações de complexos da ordem de 10-4 M, mostraram a geração de radicais hidroxil da ordem de 0,5 a 3,0 mM, também modulada pelo ligante, após alguns minutos de reação.
Desde que a citotoxicidade exibida por compostos de cobre deste tipo parece ser ativada por agentes redutores, como glutationa ou ascorbato, que promovem a redução do cobre, posteriormente reoxidado pelo oxigênio molecular [5], procurou-se determinar as propriedades redox dos compostos estudados. Experimentos eletroquímicos foram então realizados, através de voltametria cíclica (instrumento PARC, modelo 283), visando correlacionar o comportamento eletroquímico dos compostos e suas atividades catalíticas na geração de espécies radicalares de oxigênio. Os resultados obtidos foram bastante surpreendentes. Apenas um dos compostos, [Cu(dac-aepy)]2+, apresentou comportamento reversível, com Eo (CuII/CuI) = 0,03V vs. SHE em solução de DMF, contendo perclorato de tetraetilamônio 0,10M. Medidas de espectroeletroquímica, no intervalo de 0,50 a 0,25V, mostraram decaimento da banda a 260 nm, atribuída à transição p ® p* do ligante macroacíclico, e aparecimento de duas novas bandas a 317 e 380 nm, provavelmente devidas a transferências de carga, CuI ® py e CuI ® imina, respectivamente. Um nova banda a 558 nm também pode ser atribuída à transferência de carga CuI ® imina, já observada em complexos similares. Este composto, na forma reduzida mostrou ser estável sob atmosfera de oxigênio, embora seja imediatamente oxidado em presença de peróxido de hidrogênio. Ao contrário, os outros compostos estudados, apresentaram comportamento redox irreversível, tanto na ausência como na presença de oxigênio, obtendo-se picos a potenciais negativos, devido provavelmente à degradação dos ligantes coordenados. A reatividade destes compostos depende, portanto, da combinação de vários fatores.
1. M.L.P. dos Santos, A. FaljoniAlario, A.S. Mangrich e A.M Da C. Ferreira, J. Inorg. Biochem., 1998, 71, 71-78.
2. R.D. Sinisterra, R.V. Mielli, C.A.A. Carvalho, W.G. da Silva, A.S. Mangrich e A.M Da C. Ferreira, J. Incl. Phenom., 1999, 33, 203-216.
3. E.M. Pereira, M.L.P. dos Santos e A.M Da C. Ferreira, In: 22ª Reunião Anual da SBQ, Poços de Caldas, MG, 1999 - Resumos QI-034 e QI-157.
4. H. Esterbauer e K.H. Cheeseman, Meth. Enzymol., 1990, 186, 407-421.
5. C. Steinkühler, J.Z. Pedersen, U. Weser e G. Rotilio, Biochem. Pharmacol., 1991, 42, 1821-1827.