AVALIAÇÃO DO USO DA ESPECTROSCOPIA NO INFRAVERMELHO PRÓXIMO NA IDENTIFICAÇÃO DE MEDICAMENTOS


Sérgio Henrique Frasson Scafi (PG) e Celio Pasquini(PQ)


Instituto de Química – Universidade Estadual de Campinas

C.P. 6154 – CEP: 13083-970 – Campinas – SP


Palavras-chave: Infravermelho Próximo, Medicamentos, Identificação



Recentemente a sociedade brasileira tem sido abalada com notícias relatando a apreensão de medicamentos falsificados ou fora das especificações de qualidade necessárias à sua eficácia. Estas contravenções são caracterizadas, freqüentemente, pela substituição do medicamento por placebos, que não contém o princípio ativo, ou por alteração da quantidade deste princípio ativo o que reduz ou anula a ação do medicamento.

As técnicas analíticas modernas incorporam uma série de metodologias, como aquelas baseadas na cromatografia líquida de alta eficiência, capazes de determinar a composição de fármacos sendo esta a técnica mais utilizada pela indústria no controle de qualidade destes produtos. No entanto, esta técnica é muito lenta e requer operações de pré-tratamento da amostra de forma a poder ser aplicada com bons resultados. Em vista das graves conseqüências da comercialização de medicamentos adulterados e/ou falsificados é importante que técnicas rápidas, não destrutivas e de aplicação ampla possam ser desenvolvidas visando a efetiva comprovação da composição destes produtos. A espectroscopia no infravermelho próximo (NIR), baseada em medidas de refletância, apresenta estas características e se mostra com potencial para ser empregada na monitoração da qualidade de fármacos de forma rápida e sem pré-tratamento.

Neste trabalho a performance da técnica NIR foi avaliada com objetivo de verificar seu potencial e fatores que afetam o seu uso na identificação de fármacos. As medidas de refletância de medicamentos apresentados em forma sólida foram obtidas com um espectrofotômetro baseado em Filtro Óptico-Acústico (BRIMROSE – Free space, Luminar 2030) na faixa de 1100 a 2400 nm. Cada espectro armazenado é resultado da média de 300 varreduras com resolução de 2 nm. O tempo de aquisição, nestas condições, é de 30 s. Utilizou-se a primeira derivada destes espectros de forma a minimizar efeitos de tamanho de partículas e posicionamento da amostra. Como fármacos modelos empregou-se a Aspirina 500 mg (Bayer) e Melhoral 500 mg (Sydney Ross) ambos contendo como princípio ativo o ácido acetilsalicílico (AAS) sendo que o Melhoral contém cerca de 5% de cafeína na sua composição o que o diferencia da Aspirina que contém somente AAS. Outros fármacos foram investigados somente com o intuito de verificar a capacidade de identificação da técnica NIR. Os dados foram tratados no programa Unscrambler 7.5 (CAMO-Noruega) empregando-se modelagem através de Análise de Componentes Principais (PCA) e classificação via SIMCA.

Inicialmente 100 amostras de comprimidos de Aspirina e Melhoral tiveram seus espectros de refletância obtidos para ambos os lados da pastilha, totalizando 200 espectros para cada medicamento. Os espectros foram armazenados e modelados resultando em nítida separação em dois grupos. Os modelos necessitaram de 3 a 4 componentes principais para explicar até 95% da variância dos dados. A seguir, modelou-se os espectros obtidos para os comprimidos pulverizados em almofariz e colocados em recipientes circulares com o objetivo de verificar se a separação das duas classes observada, era devido a geometria distinta entre os comprimidos dos dois medicamentos ou se era devido a sua composição. Os resultados mostraram a mesma separação entre os dois medicamentos embora os comprimidos intactos não fossem corretamente classificados pelo modelo obtido com o material pulverizado. Foi observado, também que as condições ambientais afetam a classificação correta dos medicamentos. Assim, por exemplo, o efeito da umidade ambiente deve ser incluída nas amostras pulverizadas de forma que o programa empregado na classificação considere esta variável. A inclusão desta variável pode ser feita com a manutenção do material pulverizado em dissecador por 2 horas e por obtenção de espectros de refletância ao longo de uma hora com o material exposto ao ar ambiente com umidade relativa de até 90%. Dez espectros foram obtidos durante este período em que o material se hidratava continuamente. O novo modelo necessita de um componente principal adicional porém classifica corretamente 100% das amostras em qualquer condição de umidade ambiente.

O efeito do posicionamento do comprimido em relação ao feixe incidente de radiação foi avaliado para Melhoral e Aspirina. Empregando-se a primeira derivada dos espectros na modelagem a tolerância no posicionamento horizontal é de cerca de 2 mm e de 4 mm na posição vertical do medicamento. Obviamente este parâmetro pode ser facilmente mantido sob controle para medicamento sólidos.

Investigados os efeitos da umidade e posicionamento o modelo foi empregado para avaliação de novos medicamentos verdadeiros ou de medicamentos simulados ou ainda substâncias empregadas como excipiente como a lactose e bicarbonato de sódio. Também, avaliou-se a performance dos modelos com relação a identificação de medicamentos semelhantes como o AAS (Sanofi Winthrop) e Doril (DM). Em todos os casos, para os dois modelos de comprimidos (Aspirina e Melhoral) obteve-se classificação positiva para as novas amostras de diferentes lotes e negativa para outros medicamentos e placebos avaliados.

Conclui-se, portanto, que a técnica NIR, uma vez consideradas adequadamente as variáveis que influem significativamente nos espectros de refletância, apresenta alto potencial para identificação de medicamentos permitindo o seu uso como ferramenta analítica rápida e robusta na averiguação de fraudes e no controle da qualidade de medicamentos comerciais.


CAPES/FAPESP