A compreensão das propriedades funcionais dos materiais, inclusive da matéria viva, passa necessariamente pela elucidação da sua composição e estrutura química. O binômio estrutura-função criou novos paradigmas depois do surgimento e desenvolvimento das metodologias analíticas que permitiram determinar a estrutura de moléculas e seus agregados com detalhe atômico, particularmente com a descoberta dos raios-X (Roentgen, 1895) e de seu espalhamento por átomos que em cristais produzem o fenômeno da difração (Bragg, 1913). Lawrence Bragg e J. D. Bernal foram os pioneiros na elucidação das estruturas moleculares de compostos inorgânicos e orgânicos por difração de raios-X em monocristais, inaugurando todo um novo campo para a química sintética, de produtos naturais e de materiais, com bases na cristalografia. De pequenas moléculas para a estrutura de proteínas foi um passo natural, somente possível com o desenvolvimento de equipamentos e técnicas que permitiram a geração de raios-X monocromáticos de alta intensidade e colimação, bem como de goniômetros e detectores que possibilitavam o registro de milhares a milhões de feixes difratados por monocristais das moléculas de interesse. Perutz e Kendrew, estudando a difração em cristais de globinas, e Watson e Crick, observando o espalhamento de raios-X em fibras de DNA, estabeleceram a nova Biologia Molecular, com profundos impactos no entendimento dos seres vivos, tanto saudáveis quanto nos eventos infecciosos ou de disfunções celulares, e no subsequente desenvolvimento de fármacos e vacinas que de forma surpreendente aumentaram a expectativa de vida da espécie humana no nosso planeta. Desta forma, em todas as fronteiras do conhecimento humano, a química e as ciências moleculares tornaram-se centrais. Nesta palestra serão demonstrados e discutidos resultados de nosso grupo de pesquisa nas áreas de Biologia Estrutural e de Química Medicinal, tais como a determinação da estrutura tridimensional de alvos biológicos e o desenvolvimento de candidatos a novos fármacos para o tratamento de doenças tropicais negligenciadas, principalmente, a doença de Chagas e a esquistossomose.

Prof. Glaucius Oliva é Professor Titular do Instituto de Física de São Carlos. É Coordenador do Centro de Biotecnologia Molecular Estrutural, um dos centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CBME/CEPID) da FAPESP, e foi o Coordenador do Instituto Nacional de C&T de Biotecnologia Estrutural e Química Medicinal em Doenças Infecciosas do MCT, Ministério da Saúde e FAPESP (INBEQMeDI/INCT).

Seus principais interesses de pesquisa estão centrados em biologia estrutural e suas aplicações no planejamento e desenvolvimento de novos fármacos, com particular ênfase em doenças endêmicas brasileiras. Doutorou-se em Cristalografia de Proteínas pela Universidade de Londres em 1988. Hoje lidera uma equipe de pesquisas com cerca de 80 participantes, com uma composição multidisciplinar de físicos, biólogos e químicos. Tem 144 artigos publicados em revistas internacionais, os quais foram citados cerca de 2200 vezes (Abr/2012) em outros artigos científicos (ISI). Também tem liderado projetos em colaboração com empresas farmacêuticas nacionais. É Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências e Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico. Atualmente é Presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq.